José Medeiros de Lacerda

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Textos

PALÁCIO DAS LÁGRIMAS - UMA LENSA MARANHENSE
Na Rua 13 de Maio
Frente à Igreja de São João
No canto com a Rua da Paz
Existe um casarão
Sobrado de três andares
Que, segundo alguns falares,
É cheio de assombração.

O Estado do Maranhão
Sempre teve essa proeza
De contar causos e lendas
Criados na natureza
E o folclore aprimorando,
Umas que vão inventando
Outras se deu com certeza.

Veio da Corte Portuguesa
Dois irmãos interesseiros
Explorar o Maranhão
Pensando em ganhar dinheiro.
Com requinte ambicioso,
Um era mais venturoso,
O outro, mais interesseiro.

Um ganhou muito dinheiro
E fortuna conseguiu
O aventureiro, coitado,
Da pobreza não saiu
Pois trabalhar não gostava;
Pela fome que passava
Por pouco não sucumbiu

O mais rico decidiu
Se unir com uma escrava
E tiveram muitos filhos
Que ele com gosto criava
E eram bem educados
Porém, por não ser casados
Nenhum filho registrava.

Amasiado com a escrava
Numa ilegal união
Sustentava sua família
Ainda ajudava o irmão
Vagabundo, preguiçoso
Que por ser ambicioso
Pensou matar o irmão.

Preparou-lhe uma traição
Com seu requinte absurdo
Pois não sendo ele casado
O irmão herdaria tudo
Foi o plano arquitetando
Estratégias estudando
Até ter bom conteúdo.

Depois que arquitetou tudo
Concluiu sua maldade
Assassinou seu irmão
Com requintes de crueldade
Depois do sepultamento
Munido de documentos
Herdou suas propriedades.

Duas casas na cidade
Uma fazenda de algodão
Escravos tinha bastante
E uma boa criação
Para todos garantia
Que de tudo cuidaria
E da família do irmão.

Mas quem tem mau coração
Para sempre será mau
Pois água não vira vinho
Nem açúcar vira sal.
Pois aquele desumano
Transformou-se num tirano,
Algo fora do normal.

Começou a tratar mal
O povo que o cercava
Chicoteava os escravos
Mesmo se não precisava
Sobrinho era na pancada
E também sua cunhada
Só tratava como escrava.

Sempre a chicoteava
Se a ele se dirigia
Os sobrinhos que estudavam
Também ele proibia
Enfim, era um prepotente,
Se ao Diabo fizesse frente
Pra ele o Diabo perdia.

O que ele não sabia
Nem podia imaginar
Desde que o irmão morreu
Ninguém mais ouviu falar
Se ele foi assassinado,
Se existia um culpado,
Enfim, deixaram pra lá.

Mas sempre a investigar
Disfarçado, caladinho
Um filho do assassinado
O mais velho, seu sobrinho,
Nem a mãe imaginava
Que ele os cacos juntava,
Devagar, devagarinho.

Trilhando nesse caminho
Seguindo os rastros do tio
Pois sempre desconfiou
De tamanho desvario
E mentira é água fervente,
É forte enquanto está quente
Mas enfraquece no frio.

O menino descobriu
Que o tio assassinou
O pai que ele tanto amava
Da fortuna se apossou
Matou-o como um cão danado
E de um quarto do sobrado
Pela janela o jogou.

Seu corpo no chão ficou
No meio da passarela
Os transeuntes passavam
E vendo aquela mazela
Ficaram desconfiados.
Olhando para o sobrado
Viram o moço na janela.

Subiram sem mais aquela
Pra lhe dar voz de prisão,
Mulato, filho de escrava,
Não haveria perdão,
Logo na forca morria.
Era a lei que existia
No tempo da escravidão.

Do pensamento à ação,
Um patíbulo foi armado
Bem na frente da igreja
E na frente do sobrado
Com os irmãos observando
E sua mãe suplicando
Foi o menino enforcado.

Um direito foi lhe dado
A palavras derradeiras
Esperando, com certeza,
Que iam ouvir choradeira
Ele a cabeça ergueu
E à família enalteceu
Com palavras verdadeiras.

Começou pelas maneiras
Como seu tio os tratava
Sua mãe que era rainha
Voltou à vida de escrava
Seu pai foi um venturoso
E um irmão ambicioso
Por ser mal os odiava.

«De maneira forte e brava
Hoje desço ao frio chão
Este Palácio de Lágrimas
Que foi nossa redenção
Ver morrer um inocente,
E as lágrimas de minha gente
Jamais se esquecerão.

Te lanço uma maldição
Que se eternizará
Como Palácio das Lágrimas
O povo o conhecerá
Pelas lágrimas e os horrores
Que sofreu seus moradores.
Novo tempo chegará;

Ainda hoje está lá
Aquele velho sobrado
Como Palácio das Lágrimas
Eternamente chamado
A memória eternizou
E a história se tornou
Uma Lenda do Estado
Belém, 24 de Outubro de 2022
SÉRIE LENDAS BRASILEIRAS - VOLUME 39








Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 20/11/2022
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