José Medeiros de Lacerda

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Textos

COSME BENTO - A REVOLTA DA BALAIADA
O tempo da escravidão
É uma história inacabada
Lutas, revoltas, motins
Terminaram dando em nada
Dessa época sem vitória
Sempre existe alguma história
Que merece ser contada.

Por exemplo, a Balaiada
No Estado do Maranhão
Ou Guerra dos Bem-te-vis
Chamada na ocasião
Foi luta de potentados
Com pobres discriminados
E envolveu a escravidão.

Um negro da região
Já escravo alforriado,
O Cosme Bento das Chagas,
«Negro Cosme» apelidado
Provocou estrepolia,
Fez coisa que não devia
Antes de ser enforcado.

Em registros encontrados
Daquela época vulgar
Negro Cosme foi nascido
Em Sobral, no Ceará
No ano mil e oitocentos
Segundo os documentos
Que conseguiu se encontrar.

Começou a trabalhar
Separado dos demais
Servindo a seu senhorio
Em mandados especiais
E enquanto aprendia a ler
Era obrigado a fazer
Outras tarefas braçais.

Por dotes especiais,
Patrão, pra lhe compensar,
Com ele ainda bem jovem
Resolveu lhe alforriar.
Com a alforria na mão
Se mandou pra o Maranhão,
Se ausentou do Ceará.

Em São Luís a morar
Se envolveu num entrevero,
Terminou assassinando
Um tal Raimundo Ribeiro
De um fazendeiro o capanga
E para a Vila da Manga
Foi levado prisioneiro.

Fugiu sem deixar roteiro
Dessa nefasta prisão
Depois de ter provocado
Uma grande rebelião
E após se escafeder
Começou a promover
Uma vasta insurreição.

Com negros da região
Começou a devastar
Senzalas onde passava
E aos negros libertar
Andando sempre no escuro
Atrás de um lugar seguro
Pra poder se aquilombar.

Difícil de se encontrar
Agindo na escuridão
Assim passou muito tempo
Sem se ter informação
Enquanto ele escapava,
Onde chegasse fundava
Quilombos na região.

No Estado do Maranhão
A repressão comandada
Pelo Duque de Caxias
Deixava desesperada
Intensa população
Que invadindo a prisão
Deu início à Balaiada.

A invasão comandada
Por um tal Raimundo Gomes
Só conseguiu ser mantida
Com a ajuda de três mil homens
Negro Cosme comandando
Todos eufóricos bradando
«Rebelados não tem nomes!»

Cosme aliado a Gomes
Logo um título adotou
«Dom Cosme Bento das Chagas
Tutor e Imperador
Liberdade Bem-te-vi»
E ninguém chegava ali
Onde ele se aquilombou.

Nessa região fundou
Com a sua guarnição
Na fazenda Tocanguira
Lagoa Amarela, então,
Deixando ali seu legado
Maior quilombo formado
Na história do Maranhão.

Depois veio a rendição
De Gomes, seu aliado
Janeiro, quarenta e um
Passa a ser considerado
Mesmo com dificuldade
Por todas autoridades
Movimento debelado.

Cosme não foi encontrado
Naquela oportunidade
Mas sempre estava presente
Levando fraternidade
A todos que o apoiavam
E que também cultivavam
O sonho de liberdade.

Já havia a irmandade
Da Senhora do Rosário
Ele era muito devoto,
Da santa era um missionário
Reunia multidões
Proferindo seus sermões,
Construindo campanários.

Na função de missionário
Ele nunca estava só,
Andando entre multidões
Aconteceu o pior,
Por um batalhão armado
Foi visto e capturado
Na cidade de Codó.

Durante esse quiprocó
Negro Cosme foi ordeiro
Depois de capturado
Foi levado prisioneiro
Pra Capital do Estado
Onde seria julgado
Tachado de arruaceiro.

O Exército Basileiro
Envolto com a Balaiada
Adiou seu julgamento
Pra uma data a ser marcada,
Cosme fugiu novamente
De forma surpreendente
Sem se suspeitar de nada.

Em fuga desenfreada
Pra Tocanguira voltou
Seu quilombo devastado
Novamente organizou
Juntou muitos aliados
Escravos e alforriados
E uma seita fundou.

Com hierarquia  criou
Uma ordem soberana
A Guerra da Liberdade
E da Lei Republicana
Derrubando preconceito
Para o pobre ter direito
A uma vida mais humana.

Cosme Bento se irmana
Com os líderes da região
Formando um grupo forte
Pra fazer oposição
Contra os proprietários
Que oprimiam operários
E escravos da região.

Com essa reunião
Reforçou a Balaiada
Vaqueiros, ex-policiais
A classe discriminada
Escravos e lavradores
Pelo fim dos opressores
Pra quem não valiam nada.

Partiram em caminhada
Com destino ao Piauí
Ao chegarem em Caxias
Tomaram conta dali
E seguiram firmemente
Com Cosme Bento na frente
Sem ninguém para impedir.

Para melhor resumir
Aquela rebelião
Durou cerca de dois anos
Até que um batalhão
Pois fim àquela parada
Acabando a Balaiada
No Estado do Maranhão.

Alguns foram pra prisão
Outros ganharam anistia
Só negros não se renderam
E a Cosme Bento seguia
O último bando, mais forte
Resistiu até à morte
Sem direito a alforria.

Negro Cosme preso ia
No tribunal ser julgado
Primeiro por ter fugido
Da cadeia e sublevado
Escravo a se rebelar
E por quilombos formar,
Por isso foi condenado.

Na hora em que foi julgado
No ano quarenta e dois
Em frente à cadeia pública
Não deixaram pra depois
Setembro o mês indicado
Foi Negro Cosme enforcado
Na praça e ninguém se impôs.

Com o final desses dois
O movimento acalmou
Era final de reinado
E novamente aumentou
Arruaças, rebeliões,
Motins e agitações
Que a regência dominou.

Mas essa época ficou
Com uma mancha infeliz
O período regencial
Não teve boa diretriz,
Economia fracassada
A fase mais conturbada
Na história do país.

Nesse período infeliz
Já tinha no Maranhão
Duzentos mil habitantes
E dessa população
Mais da metade eram escravos
Que lutavam como bravos
Nas lavouras de algodão.

Vaqueiros e artesãos
Pequenos agricultores
Que mesmo não sendo escravos
Sofriam ante os opressores
Grandes latifundiários
Com regimes sanguinários
Que oprimiam os moradores.

Os grandes exportadores
Tiveram que amargar
As baixas na exportação
Sem dinheiro pra pagar
A mão de obra barata
E o regime escravocrata
Sem poder escravizar.

Na política a se enfrentar
Haviam os competidores
A oposição liberal
Contra os conservadores
Bem-ti-vis, os mais humanos.
Conservadores, cabanos
Os principais contendores.

Quem luta contra opressores
Não consegue obter nada
Mas isso não me interessa
Se é história a ser contada,
Só usei meu conhecimento
Pra falar de Cosme Bento
E a Revolta Balaiada.
Manaus, 21 de Outubro de 2022
SÉRIE ESCRAVIDÃO - VOLUME 27
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 19/11/2022
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