ZEFERINA - QUILOMBO DO URUBU
Mais uma história esquecida
Do tempo da escravidão Que as escolas não contam Nem passa informação O tempo vai esquecendo E a cultura vai perdendo Toda sua tradição. Mas na minha opinião É preciso preservar Toda história do passado Para sempre se contar E o tempo da escravidão Deixou grande tradição Na Cultura Popular. Aqui pretendo falar De uma negra menina Que foi trazida de Angola Numa feroz disciplina Desde criança serviu À escravidão no Brasil Até cumprir sua sina. Seu nome era Zeferina Dela nada se sabia Apenas que foi escrava No Estado da Bahia Mesmo sendo sofredora Foi guerreira, defensora E mostrou soberania. Ela chegou na Bahia Nos braços da mãe amada Amália, que nos registros Dela não se sabe nada Mas à filha ela ensinou Sua cultura e a deixou Espiritualizada. Amália era dotada Das culturas ancestrais E para a filha passou Seus dons espirituais Zeferina foi altiva E sua cultura está viva Até os dias atuais. Serviu nos canaviais Junto a seu povo bantu Mostrando soberania Aprontou um sururu Muitos guerreiros juntou Fugiu pra o mato e fundou O Quilombo do Urubu. Hoje a cultura bantu É grande na região Com candonblés e outros cultos Da africana nação Como pedras e cascatas E grandes trechos de matas Ainda em preservação. Voltando à escravidão Nosso tema principal Zeferina reuniu Um grupo no matagal De índio, escravo fugido E partiram reunidos Pra invadir a capital. Eles sabiam afinal Que íam ser atacados O Quilombo do Cabula Que era ali aproximado Já não existia mais, Há alguns anos atrás Havia sido dizimado. Com o levante organizado Eles partiram de fato Zeferina no comando Levando seu aparato Mas quase viraram presa Num ataque de surpresa De alguns capitães do mato. Mas o ataque de fato Virou grande confusão Os capitães encontraram Uma grande multidão De índios escravizados Mulher e homens armados De flecha, foice e facão. Haja cair capitão Na surpresa essa hora Com o duelo travado O sangue tingindo a flora Três mortos e três feridos O grupo surpreendido Evadiu-se e foi embora. Nessa fuga pela flora Os capitães mais adiante Levando os outros feridos Encontraram o comandante José Baltazar Silveira Que vinha com a cabroeira Pra sufocar o levante. Foi a partir desse instante Que o conflito aumentou Vinte soldados e um cabo Que vinham de Salvador à caça de meliantes Encontraram o comandante E o batalhão reforçou. A batalha se travou No tabuleiro e na serra "Morra branco e viva negro" Esse era o grito de guerra Que na floresta ecoava, Negro morria e matava Com o sangue cobrindo a terra. A batalha só se encerra Com a prisão e Zeferina Três homens e uma mulher Mortos na carnificina Uns fugiram outros feridos Outros com a chefe detidos Foram cumprir sua sina. Amarraram Zeferina Que não prdeu seu mister A fúria do escravocrata Recaiu sobre a mulher Que seguiu acorrentada Pelas ruas arrastada Até a Praça da Sé. O brio daquela mulher Mostrou sua realeza Do Quilombo do Urubu Ela seguiu com firmeza Servindo de zombaria Mas não se acovardaria, Era a sua natureza. Mesmo sem mostrar fraqueza Começou a definhar Por se sentir impotente Presa no Forte do Mar Foi vivendo com saudade Sua espiritualidade Até a vida acabar. Pelas mãos do militar Seu corpo foi sepultado Na região do Cabula Um quilombo dizimado Mas na Mata do Urubu Com a religião bantu Ela deixou seu legado. O urubu era sagrado Por aquela região Era o pássaro correio Que ouvia a lamentação Para a África voaria Levando e de lá trazia Conforto e compreensão. Era uma tradição Herdada dos ancestrais Que os recentes quilombolas Preservam nos matagais Nos candomblés e terreiros, O urubu é o mensageiro Do povo aos seus orixás. Hoje não existe mais Da forma que aconteceu O mocambo principal Único que sobreviveu Conseguiu ser reformado Depois sendo nomeado Parque São Bartolomeu. A população cresceu Nesse quilombo lendário Uma grande área verde Forma um bonito cenário Bem fácil de se encontrar Entre o Bairro Pirajá E o Parque Ferroviário. O seu povo é temerário Devido às imprecauções O racismo estrutural E as grandes perseguições Sofridas dos opressores Que abominam seguidores Das afro religiões. Mas essas imprecauções Não abalaram a fé Do Quilombo do Urubu Que até hoje ainda é Um povo bravo e afoito E mantém setenta e oito Terreiros de candomblé. Zeferina foi mulher Valente e destemida Que lutou pelo seu povo Embora desguarnecida Guerreou como podia Pra dar ao povo alforria E por eles deu a vida. Escrava desconhecida Dela não se conta nada Do período escravagista Ela não é estudada Mas mesmo em lembrança vaga Sua história, sua saga Em Salvador é lembrada. Pra isso eu vivo na estrada Região a região Pesquisando em todo canto De nossa imensa Nação E deixo aqui registrado Mais um conflito passado No tempo da escravidão. Zé Doca-MA, 08/12/2016 SÉRIE ESCRAVIDÃO - VOLUME 12
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 18/11/2022
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