TERESA DE BENGUELA - QUILOMBO QUARITERÊ
Gosto muito de escrever
As histórias do passado, Do tempo dos cangaceiros, Do período de reinado, Dos tempos de escravidão, De terror, de opressão, De assassino e assassinado. De tanto ter pesquisado Muita história conheci Do tempo da escravidão Já falei sobre Zumbi, Rio Preto, Lucas da Feira, Dandara, outra guerreira, Dessa eu nunca esqueci. Outra de quem escrevi Que sofreu muita mazela Foi a mártir Anastácia, Morreu com muita sequela Tendo o rosto deformado Seu corpo foi sepultado No altar de uma capela. A Teresa de Benguela Uma escrava afriacana Da grande nação Bantu De uma vida soberana Foi trazida em cativeiro Em um navio negreiro Pra Nação brasiliana. Essa escrava africana Foi valente, foi guerreira Vendida no Mato Grosso Para uma jazida mineira Negou-se a ser uma mucama, Preferiu dormir na lama Com sua gente altaneira. Essa valente guerreira Mostrou sua valentia Dormia numa senzala Trabalhava todo dia Ao lado dos seus guerreiros Sem aceitar cativeiro Deu início à rebeldia. Rodeados de vigia Trabalhavam sem cessar Eram explorados nas minas Sem direito a descansar Quem ali não produzisse Fizesse qualquer tolice No tronco ia parar. Mato Grosso era um lugar Que negro não era gente, Trabalhavam dia e noite Fazendo açúcar, aguardente, Derrubando o matagal Fazendo cerca e curral Para o senhor inclemente. Nas lavras de ouro, quente, Trabalhavam noite e dia Desgastando ainda mais Sua saúde doentia Sofriam alucinações Com as febres e sesões Seu corpo todo tremia. Os feitores lhes batiam Nisso eles tinham prazer Fosse no tronco ou garrote Fazendo negro sofrer Com terríveis desenganos Eram castigos tiranos Que doíam pra valer. Com as minas a perecer Negro era mais explorado Levado pra agricultura Sofrimento era dobrado Abrir floresta no peito, Dormir sem teto, no eito Um no outro acorrentado. Pra ter crédito aprovado Negro era garantia No custeio da lavoura Pois era mercadoria De valor muito elevado, Quando o senhor, descarado, Penhorava e não vendia. Nessa região havia A Fazenda Cacimbão De um tal Pereira Leite Que era também capitão Tido como dos mais bravos; Tinha duzentos escravos Plantando milho e feijão. Faziam para o patrão Pastel, bolo e outro tanto, Pra eles catimpuera Jaguaroba e arroz de santo Pra aplacar o sofrimento, Era esse o pagamento Por ter trabalhado tanto. Mas Teresa, no entanto, O seu sonho conservava Liberdade pra seu povo Pelo que ela observava Entregues à própria sorte Maus tratos, açoite e morte Era o que negro ganhava. Se alguém fugir tentava Dessa horrível condição, Era seguido e caçado Com tal determinação Que os feitores desumanos Batiam feito uns insanos Sem a menor compaixão. Distorcendo a situação Os patrões em estribilho Diziam que suas «peças» Eram tidos como filhos Trazendo o povo enganado, Mas escravo era trocado Por quatro alqueires de milho. Esses «tidos como filhos» Pra fugir da escravidão Aproveitam os ataques Dos índios da região, Suruís, Camayurais, Caiapós e Payaguais Índios de garra e ação. Açoite, mutilação Era o que negro sofria Tortura com ferro em brasa Se algum escravo fugia Mas tudo o patrão negava, Pra fora até ocultava Quando um cativo morria. O escravo Zé Maria Que tinha sangue no olho Andou convocando uns negros Para engrossar o molho E, como salvo conduto Fugir, fundar um reduto, O Quilombo do Piolho. Tão logo um grande molho Tratou de se escafeder E o Quilombo do Piolho Chamou-se Quariterê Um bando de negro armado Tudo bem organizado Pra poder se defender. Quilombo Quariterê Tinha paliçada e fosso Próximo ao Rio Guaporé Na região de Mato Grosso Oculto até do vento Com conselho e parlamento, Um verdadeiro colosso. No Quilombo em Mato Grosso Tinha Teresa, a rainha, Que junto com seu conselho Faziam o que lhes convinha Com José, o seu marido Tinha tear pra os tecidos E mandioca pra farinha. Teresa virou rainha E passou a liderar Quando José faleceu E ela soube comandar Com fé e perseverança E com sua liderança Fez o quilombo aumentar. Começou a agregar Outros tipos de pessoas Como os índios bolivianos Que andavam vagando à toa Quilombo cresce depressa E o crescimento começa A incomodar a coroa. E Teresa, numa boa, O quilombo comandando Organizou uma estrutura Com tudo se transformando Os negros se protegendo Na forja armas fazendo E os brancos se alarmando. Com Teresa comandando Fez boa administração Com o negro e o indígena Convivendo em comunhão Em paz e com paciência Trocando as experiências, Uma cultural atração. Quilombo virou nação Sempre bem estruturado Quariterê foi crescendo Quase se tornando Estado Integrado à natureza E o poder de Teresa Por todos era invejado. O branco necessitado Devido a escassez De escravos nas fazendas Pede ao trono português Para bandeiras formar Na intenção de tirar Do Quariterê a vez. Assim o Império fez Com um grupo bem armado Era a famosa bandeira De João Leme do Prado Que ataca sem defesa O quilombo de surpresa Trazendo capturados.. Depois do susto passado Houve luta o mês inteiro Com os negros resistindo A voltar pro cativeiro Com garra, força e vontade Porque pela liberdade Se morre ou mata primeiro. Um grupo de fazendeiros De Santíssima Trindade Junto com o poder público Patrocinam a crueldade Cujo único proceder: Atacar Quariterê Acabando a liberdade. Trazidos para a cidade Os negros capturados São postos na praça pública Pra serem identificados Por seus antigos patrões Depois sofrer punições Com a letra «F» marcados. Mesmo sendo atacados Lutam pra sobreviver A Teresa de Benguela Mostrou todo seu poder Fundando nova nação Uma ramificação Um novo Quariterê. Negros pra sobreviver Fugiam mais apressados E deixavam suas vilas Também os seus povoados Pouso Alegre, Boa Vista, Rosário Oeste, conquista Que eles tinham fundado. Quariterê reforçado Teresa ficou mais forte O quilombo produzindo Tendo até gado de corte Tudo se desenvolvendo Com os negros prometendo De lutar até a morte. Uma bandeira mais forte Estava sendo preparada No ano noventa e um Ela foi organizada Um reforço paralelo Com Francisco Pedro Melo À frente da empreitada. A equipe determinada O Alferes de Aragão Comanda sua bandeira Com grande obstinação Disposto a exterminar Com o quilombo e arrasar Toda sua plantação. Negros com foice e facão E outras armas de corte Brancos com armas de fogo Negros não tiveram sorte Mas lutaram com vontade Defendendo a liberdade Sem temer a própria morte. Teresa, rainha forte, Sempre de arma na mão Comandava com coragem A bravia reação Com um objetivo novo Gritava para seu povo: «Defendam o nosso chão!» Governava a região Luis de Souza Coutinho Que queria ver Teresa Se acabar devagarinho, Seu império cairía E a desordem acabaria Com ela fora do ninho. Teresa enfrenta Coutinho Com orgulhosa umbridade Resistiu tão bravamente Mostrando sua qualidade Com seu povo guerreando Preferiu morrer lutando Pela doce liberdade. Lutou com tenacidade Negro e branco se enfrentando Quariterê resistindo Mas o tempo foi passando, Vencendo a artilharia E a grande supremacia Foi a todos dominando. Por Teresa procurando Em meio à destruição Entre mortos ela estava Caída, de arma na mão Com ar de serenidade; Morrer pela liberdade Foi sua grande missão. Ecoou na região De Teresa o proceder Fundam a Aldeia Carlota Para ninguém perceber Daquela chacina feia E que antes de ser aldeia Ali foi Quariterè. Teresa foi bem-querer Exemplo de negritude Para os afro-descendentes Deixou sua atitude E entre seus procedimentos Ficou seu pronunciamento: «Lute, tente, grite, mude!» Hoje o termo negritude No trabalho, pão e mesa É o reconhecimento De que tem com certeza Que coragem e rebeldia Tudo começou um dia Com a coragem de Teresa! Santa Luzia, 14/04/2016 SÉRIE ESCRAVIDÃO - VOLUME 10
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 18/11/2022
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