José Medeiros de Lacerda

Leia poesia - A poesia é o remédio da alma

Textos

A TRÁGICA MORTE DE CRISTINA DE PORTUGUÊS
Essa é mais uma história
Ocorrida no cangaço
Quando tudo acontecia
E terminava em fracasso
Estavam sempre correndo
Matando e também morrendo
No maior estardalhaço.

Mulher só tinha fracasso
Andando com cangaceiro
Que morriam em combate
Ou apanhavam do parceiro
Poucas se saíram bem
Pois só se vale o que tem
Neste mundo interesseiro.

A morte entre cangaceiros
Era coisa corriqueira
Pelas regras que criavam
De forma vil e grosseira
Se um ou outro discordava
Geralmente terminava
Com a cara na poeira.

Uma equipe cangaceira
Chegou em uma fazenda
Lá no sertão de Sergipe
Não estavam em contenda
Como sempre acontecia
Pois dessa vez só queria
Fazer umas encomendas.

Ao chegarem na fazenda
Provocaram um alvoroço
Nas moças da região
Pois era um grupo bem moço
Bem vestido, perfumado
Em bons cavalos montado
Lenços de seda ao pescoço.

Essa equipe de moço
Chefiada por Português
Foi muito bem recebida
Por um antigo freguês
E sairiam sem zuada
Se não fosse a trapalhada
Que o chefe do grupo fez.

O chefe era Português
Com foi esclarecido
O grupo era pequeno
Com seu lenços coloridos
Bonitos chapéus de couro
No dedos anéis de ouro
Perfumados, bem vestidos.

Não houve um atrevido
Que atrapalhasse a ação
Chegaram todos em paz
Porém em compensação
Os de lenço no pescoço
Causaram grande alvoroço
Nas moças da região.

Alvoroço e confusão
Recado vai, flerte vem
Namoricos pelos cantos
Mas sem ofensa a ninguém
Até que chegou a hora
Daquele bando ir embora
E com eles mais alguém.

Português levou um bem
Que mudou a sua sina
A prenda que ele levou
Era uma bela menina
Magra, de seios pequenos
Olhos vivazes, amenos
E se chamava Cristina.

Essa ditosa menina
Sonhava com aventura
Conhecer o mundo além
De sua máquina de costura
Por impulso desejou
O sonho concretizou
E perdeu a compostura.

E seguiu essa aventura
Tomando iniciativa
Juntou-se com Português
E seguiu na comitiva
Aos pais abandonou
E o cangaço ganhou
Uma cangaceira ativa.

Cristina era muito viva
E seguiu com aquela gente
Pra ela era aventura
Aquele novo ambiente
Participando de brigas
Confrontos, coitos, intrigas
Tiroteio e tempo quente.

Já entrou praticamente
Trajada de cangaceira
Já toda paramentada
De bornal e cartucheira
Chapéu, lenço colorido
E um bonito vestido
De mescla azul verdadeira.

Sua verve aventureira
E o fogo que Deus lhe deu
Não a deixava entender
Que agora o destino seu
Era se integrar ao bando
E seguir acompanhando
O homem que ela escolheu.

Mas ela não entendeu
E resolveu se soltar
Fez valer sua liberdade
E em outros procurar
O fogo que Português
Por mais empenho que fez
Não conseguiu apagar.

E resolveu paquerar
Se espalhar no acampamento
Zombar de um e de outro
Provocar constrangimento
Brigas entre companheiros
No meio dos cangaceiros
Fez um grande movimento.

Até que em dado momento
Provocou grande desmando
Ao concretizar um caso
Com um cabra de outro bando
Português inconformado
Queria se sentir vingado
E começou os desmandos.

Foi num encontro de bandos
Em um final de semana
Cristina se enrabichou
Por um tal de Gitirana
Cangaceiro de Corisco
Correndo todos os riscos
Que o cheiro de pólvora emana.

Cristina mais Gitirana
Estavam sempre agarrados
E o estopim foi aceso
Em um baile perfumado
Português se alterou
A coisa se complicou
E quase morre um bocado.

Gitirana era entroncado
E bastante habilidoso
Moreno, cabelos lisos
Bom de briga, musculoso
Namorador infalível
Sedutor incorrigível
Repentista talentoso.

Também era buliçoso
Gostava de chavecar
As mulheres dos amigos
Pra ver o caldo entornar
Com Cristina foi além
Sem depender de ninguém
E sem nada disfarçar.

Português a observar
Aquele comportamento
Planejou uma vingança
Fora do acampamento
Sem complicações depois;
Liquidar aqueles dois
Estava em seu pensamento.

Aproveitou o momento
De uma reunião
Entre o bando de Corisco
E o bando de Lampião
Em um coito em Alagoas
Pra combinar umas boas
Estratégias de traição.

Fez uma combinação
Com um cabra de confiança
Chamado de Catingueira
Para fazer a matança
Assim que uma ocasião
Facilitasse a ação
Sem provocar uma lambança.

Esse cabra de confiança
Já havia assassinado
O cangaceiro Marreca
Atendendo a um mandado
De Português o traido
Que já agia escondido
Para se sentir vingado.

E no encontro marcado
Dos cabras em reunião
Português e Catingueira
Preparavam a traição
Corisco a observar
Comentava com Dadá:
Aqui vai ter confusão.

E seguiu na direção
Se afastando dos demais
Dirigiu-se a Português
No meio dos carrascais
E na pergunta foi franco:
- Que é isso, «boi do cu branco»?
Tu quer matar meu rapaz?

Dessa vez você não faz
Como fez da outra vez
Quando assassinou Marreca
Com a ajuda de outros três
Mas homem meu tu não mata.
Se fizer qualquer bravata
Sou eu que mato vocês.

Nessa altura Português
Reuniu sua cambada
Se instalou no acampamento
Um clima barra pesada
Nisso o bando de Corisco
Já se aproximou arisco
Todos de arma engatilhada.

E no meio da zuada
Se aproximou Lampião
Que acompanhava de longe
A poeirenta questão
E resolveu intervir
Antes de alguém cair
Estrebuchando no chão.

Controlada a confusão
Formou-se um tribunal
Dentro das leis do cangaço
Para julgar o casal
Até Corisco se impôs
E alí nenhum dos dois
Chegou ao ato fatal.

Cristina ali se deu mal
No meio do rebuliço
Maria Bonita e Dadá
Não ajudaram no enguiço
Corisco entrou na querela
Dizendo: Deu o que dela
Ninguém tem nada com isso.

Pra resolver o enguiço
O chefe-mor Lampião
Terminou por condenar
Cristina pela traição.
Pra terminar tudo em paz
E ali ninguém brigar mais
Tomou uma decisão.

A única resolução
Sensata naquela hora
Era esquecer o passado
Mandar Cristina ir embora
Pra sua família voltasse
E Português procurasse
Pra ele outra senhora.

Dadá resolveu na hora
Auxiliar a Cristina
Lhe preparar pra viagem
Sem saber que sua sina
Estava predestinada
A morrer numa emboscada
Vítima de carnificina.

Deu um vestido a Cristina
Com a barra recheada
De dinheiro pra ajudá-la
E ela partiu montada
Num cavalo galopando
Com um coiteiro acompanhando
À sua antiga morada.

Mas caiu numa emboscada
Juntamente com o coiteiro
Cangaceiros Luis Pedro
Juriti e Candeeiro
Cristina foi derrubada
E bastante esfaqueada
Lá mesmo no tabuleiro.

Desesperado o coiteiro
Fugiu para não morrer
Cristina implorou chorando
Sem poder se defender
Mas assim mesmo a mataram
E numa vala a deixaram
Para os urubus comer.

Coiteiro volta a correr
Numa grande agitação
Chegando no acampamento
Conta tudo a Lampião
Que ficou inconformado
Por Português ter mandado
Promover a execução.

Vingado da traição
Português foi alegando
Que se prendessem Cristina
E acabassem a torturando
Ela não resistiria
E por fim revelaria
O esconderijo do bando.

Esse foi mais um desmando
Quando o cangaço existiu
Cristina sonhava alto
Praticava desvario
Não aproveitou em nada
Sua liberdade sonhada
E foi morta a sangue frio.
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 07/11/2021
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