A FILHA DO CORONEL E O FERREIRO APAIXONADO
Sou viajante e poeta
Levo a vida a viajar Colhendo aqui e ali Estórias pra versejar E o tema deste poema Consegui em Capanema No estado do Pará. Um moço do Ceará Essa história me contou Vivida por ele mesmo No dia que se apaixonou Por filha de coronel A quem ele foi fiel Agregado morador. Assim ele me contou: “Eu era um pobre ferreiro Trabaiava na fazenda Do coroné fazendeiro Pai da menina Lazinha Por quem vez em quando eu tinha Os meus oiá de vaqueiro. Mas para meu desespero Nem para mim ela oiava Embora fosse ciente Que muito dela eu gostava Mas era de um cabeludo Um caboco bem taludo O sujeito que ela amava. Uma tarde eu estava Na minha forja lutando Quando ela se apaixonou No seu cavalo trotando Pediu água pra beber Mas nem se quer quis descer Ficou na sela esperando. Bebeu água e foi andando Sacudindo em sua sela Saiu sem me agradecer Também nem oiei pra ela Só oiei pro seu pezinho Carçado num tamanquinho Com a parmia amarela. Quando era procurada Nas cartas ela dizia Na mão ela adivinhava No cristal ela previa Mas a pobre malfadada Era sempre acreditada Depois que acontecia. Deu vontade certo dia Deu ir falar com a cigana Pra saber desses tormento Que sempre me desengana A respeito de Lazinha Se o seu amor me convinha Ou se o coração me engana. Na minha besta ruana Cheguei eu no seu terreiro Depois de me apresentar Que eu era um pobre ferreiro Que mesmo sendo cascudo Era bonito e taludo Embora sem ter dinheiro. Rafisa, disse o ferreiro, Era um pouco desgrenhada Também tinha a latumia De uma Medusa da estrada Era bonita e faceira Descontada a cabeleira E a saia sarapintada. Parei na sua calçada Tirei meu chapéu de couro Parei um pouco e oiei Com esse óio de mouro Disse cheio de divisa: -Boa tarde, dona Rafisa, Desculpe meu desaforo. Tou vindo de Logradouro Mode umas coisa saber A muito tempo conheço A fama de vosmicê Queria uma explicação É lance do coração, Queria pois me receber. Primeiro faço saber Que não gosto de fuxico Mas o caso e muito sério Me deixe entrar que eu explico Siá Rafisa, ocê me escuta E se falo não discuta Pois se eu calo me complico. Sei que tou pagando mico Com esse jeitão de matuto A cigana ficou seria Com o oiá absoluto De cima a baixo me oiou A mão no colo botou Com aquele ar arguto. Coçou o seu cocoruto E na mesa da cozinha Com seu jeito sensual Sentou depois da voltinha Mandou também eu sentar E com o baralho a cortar Perguntou sobre Lazinha. Eu disse: E uma princesinha Filha do coronel Xisto Sabe que eu gosto dela Mas finge que eu não existo E quanto mais me ignora Mais meu coração lhe adora, Por isso que eu não desisto. Falar com ela eu insisto Quando ela passa montada Mas ela não me dá trela Junto com a molecada Joga moeda no ar Pra meninada juntar No meio da gritaiada. Vê nessa carta cortada O que faço pra arrancar Do meu peito essa urtiga Dessa paixão me livrar Pois isso tá me afetando Meu coração apertando Num posso nem respirar. A cigana, sem falar As cartas embaralhou Cortou, separou um monte Umas na mesa espalhou Olhou presse capiau Levantou um dois de paus E dessa forma falou: - Como se chama o senhor? Lhe respondí: - É Amaro Homi! – Me disse a cigana - Tá escrito aqui tão claro Como uma fogueira em chama, Essa carta não me engana E eu num vou nem cobrar claro. Ela disse: - Seu Amaro, Precisa o senhor ter calma A coronelinha vai Beber água em sua palma Se é que isso lhe apraz. Mas não posso dizer mais Pelo bem da sua alma. Sai dali com mais calma Semeado de esperança Pra minha forja voltei Terminada minha andança Me danei a trabalhar Pacientemente a esperar Com a cigana na lembrança. Quinze dias de esperança Se deu o estardalhaço A moça veio beber Na parma desse palhaço Caminhou mais de três légua Sangrando quase sem trégua Pra vir morrer nos meus braços. No momento do trespasso Caiu na minha calçada Pois o cabra cabeludo Deu-lhe um tiro de emboscada. Enquanto eu lhe amava Lazinha se apaixonava Por uma pessoa errada. Parecendo alma penada Lamentando minha sorte Eu voltei lá na cigana Com um pensamento forte Perguntei se ela sabia Para me dizer o dia E a hora da minha morte. Um sertanejo do norte Sofrendo desilusão De ter amado uma moça Baleada no pulmão Por um pretendente em mágoa Morreu bebendo da água Da parma da minha mao! Manaus, 21/05/2012
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 04/07/2014
Alterado em 12/07/2015 Copyright © 2014. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |