José Medeiros de Lacerda

Leia poesia - A poesia é o remédio da alma

Textos

A ORQUESTRA FLATORMÕNICA DA VILA DE CARITÓ
Escrito por Adriano Medeiros



Ai no sertão uma terra
Por nome de Caritó,
Terra de mulher direita,
Cabra macho de dar dó,
Onde fiquei satisfeito
Quando vi ter sido eleito
O prefeito Pedro Bó.

Mode não governar só
Mas com a população
Fazia toda semana
A grande reunião
Com gente de cada rua
Tanto fosse gente sua
Como da oposição.

É claro que Pedro não
Deixou a zona rural
Sem ter seus representantes
No forum municipal:
Chica do Cuscuz Molhado,
Arengueira do Talhado,
Fatão do Arranca Pau,
  
Vereador do Curral,
Nico da Cobra Ligeira,
Gonzaga do Principal,
Maria da Trepadeira;
O Negão do Pau Graúdo,
Rita do Engole Tudo
Maria da Cuspideira.

Ninguém falava besteira,
Somente coisa importante:
Se pedia operação
E carro pra estudante;
Ambulãncia pra doente
E muita chapa de dente
- O pedido mais constante.

Pedro Bó, muito elegante,
Nunca negava pedido,
Mas também em seus projetos
Queria ser atendido:
De cima do tamborete
Alevantava o cacete
E era muito aplaudido.

O povo foi convencido
A cultivar no quintal
Produtos hortigranjeiros;
Apoio municipal
Pedro garantiu que tinha:
Pra criação de galinha,
Pra fazer horta e curral.

Pedro Bó não se deu mal
Em seu empreendimento
Pois taxou a produção
Em vinte e cinco por cento:
O povo tinha fartura,
E a sua prefeitura
Dobrou o faturamento.

Há grande contentamento
Entre a população:
Caritó enriqueceu,
Ganhou fama no sertão.
Não há fome na cidade,
E mesmo a obesidade
Já é preocupação.

Quem só comia feijão
Com rapadura e farinha
Passou a comer saladas,
Arroz, carne de galinha...
Foi um milagre bonito:
Onde só tinha cambito
Hoje tem coxa e bundinha.

E quando é á tardinha
Só se vê gente a malhar:
Uma modelando o corpo,
Outro a barriga a baixar.
Ninguém mais fala de corno
Porque chifre é um adorno

Pedro Bó manda alistar
Quem passa necessidade:
Os pobres, os desvalidos;
Que vivem da caridade
Mas não se acha ninguém
Porque todos vivem bem
Naquela comunidade.

E por unanimidade
Pedro Bó foi reeleito
Para por mais quatro anos
De Caritó ser prefeito:
Nas no segundo mandato
O sertão, que é ingrato,
Quis complicar o sujeito.

Uns dizem que foi despeito
Duma cidade vizinha:
Outros dizem que foi praga
De uma tal de Candinha
Com raiva de Pedro Bó:
Mas infestou Caritó.
O piolho de galinha

Ainda bem que se tinha
Os ovos pra se comer
Porque carne de galinha
Viu-se desaparecer:
Quem fosse atrás de penosa
Pegava a peste horrorosa
Se coçava pra valer.

   Chegou-se até morrer
Com a Peste da Coceira,
E, como se não bastasse
Deu na terra uma canseira
No tempo do tal piolho
Que só nascia repolho
Pela cidade inteira.

- Leitor, não faça besteira
De tal dieta imitar:
Comer ovos com repolho
Café, almoço e jantar...
Pode ser voce quem for,
Porém perto do senhor
Ninguém vai querer ficar!

Eu vi gente desmaiar,
Cair no meio da rua:
Vi senhora de respeito
Correndo de casa nua:
Vi muita gente raivosa
Contra a tal onda gasosa
Que durou mais de uma lua.

Quando até cachorro acua
Latindo desesperado...
Quando caminhões de flores
Não trazem mais resultado...
Quando explodem bombas químicas
De tão sonorosas cinicas...
Pedro Bó tá desgraçado

      
  O povo desesperado
Na quinta reunião.
Uma nuvem azulada
Subindo da multidão...
Pedro Bó pega o cacete,
Assobe no tamborete
E diz:-"Tenho a solução!"

-"A Capital da Nação
Tem sua orquestra sinfônica
Muitas de nossas vizinhas
Tem orquestra filarmônica:
Carító, especial
Vai ser mais original
Com orquestra flatormônica!»

Eis que sua filha Mônica
Dá um peido em Dó maior:
Depois três peidos em Si,
Em seguida em Ré menor.
Alguém grita;-"Eita Diabo!
O sertão tem muito rabo,
Mas esse é o melhor!"

Eis que o cidadão-mor,
O nosso ilustre prefeito
Não gostou de ver a filha
Ser tratada de tal jeito.
Num raivoso cacoete
Alevanta seu cacete
E diz:-´´Exijo respeito!´´

-"Não vou atrás do sujeito
Que soltou essa piada
Para não deixar a rua
Da cidade ensanquentada...
Porém saiba, Caritó:
Deu muito trabalho em Dó
Deixar uma bunda afinada!

Pois ela foi programada
Na afinação de Si.
O namorado tentou
Mas sem nada conseguir:
Só quando eu entrei sem dó
Foi que este fiofó
Veio de Ré, Dó e Mi.``

Viu-se o povo aplaudir:
-"Bunda afinada é um luxo!
O nosso ilustre prefeito
È mago, sábio, é bruxo!''
Então Pedro Bó mandou,
E a multidão separou
Primeiramente o gorducho:

"Quem tiver grande seu bucho
Que fique lá sob a trave,
Pois sei que todo gorducho
Tende a peitar em grave:
O excesso de ácido graxo
Torna necessário, acho,
Que o gordo a bunda lave!

A baixotes dou a chave:
Fiquem debaixo do prédio!
Bem sei que todo baixinho
Costuma peidar em médio.
E, às exceções devidas,
Depois que forem ouvidas
A gente acha remédio.

E pra acabar o tédio
De quem for magro e alto,
Cês podem ficar tranquilos,
Não precisa sobressalto:
Segundo o meu estudo:
Vocês peidam em agudo
Podem ficar no asfalto!"

Com rouca voz de contralto
Assim se expressou Mônica:
- "Durante a afinação
Gritei de ficar afônica,
Mas papai foi competente
E depois fiquei contente
Pela Banda Flatormônica!

A bunda, pra ser harmônica,
Carece de afinação.
O marido incompetente,
Ciumento, ou o machão
Cioso de seu brioco,
Ligue pra mim que em pouco
Levarei um maranhão.

Papai á disposição
Mandou dizer que está,
Como também Chico Tromba
E Negão do Paraná.
Pode ser homem ou mulher,
Pois o importante é
À nossa banda afinar!"

Deram para ensaiar
Nessa mesma ocasião
E o que era problema
Se tornou a solução.
Um afinador devido
Ao ar bem comprido
Dá volume e entonação.

Hoje a maior atração
De Caritó é a banda
Sob a batuta certeira
Do grande maestro Danda
Primeiro a banda de flatos
Foi pra Campina e pra Patos,
Hoje pelo mundo anda!

Pois o dinheiro é quem manda
Ele é quem faz e desfaz!
Das velhas dificuldades
Ninguém quase lembra mais.
Foi-se a Peste do piolho,
Porém com ovo e repolho
Dieta a tal banda faz.



Na Festa de são Tomás
Foi com orgulho que vi
Balofo peidar de tuba,
E de tarol Genessy.
Marilta peidar raivosa,
Fatão peidar poderosa
Peidar pulando o Saci.

Vou parando por aqui
Que o tempo nunca sobra:
Se a gente se distrai
A Velha da foice cobra
- Leitor, de mim tenha dó:
Será que, tal Pedro Bó,
Eu fiz uma grande obra?

Do poema:

A DUPLA FACE DE DEUS
De Adriano Medeiros


O leitor que por acaso
conheça os escritos meus
- esses rabiscos raquíticos,
uns magros, outros plebeus -
sabe: trago sempre viva
a idéia obssessiva
de ver a face de Deus.

Pois bem, no rol dos ateus
Não posso ser incluído...
Vivo qual cego no mundo
A procurá-lo, aturdido:
Ou talvez seja um profeta
Deus seria a linha reta,
Caminho fácil, perdido.

Estará Deus escondido
No fogo, raio ou trovão?
Será Deus talvez um bicho,
Águia, serpente ou leão?
Ou será que nós engana
Assim com a face humana
Como a nossa, caro irmão

Falam dele no Corão,
Na Bíblia e na Cabala.
Vaca dizem ser na Índia,
Imagem posta na sala;
Na Grécia, forças irmãs
Travaram guerra, Titãs:
Seu poder a terra abala.

Há quem o defende à bala
Ou com Santa Inquisição;
Há quem planeje atentados
Que botam torres no chão;
E há quem use a guilhotina
Para negar sua sina,
Mandam Deus pro paredão.

Série  Parceria - Vol. VIII
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 12/02/2012
Alterado em 04/07/2014
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