A CONFERÊNCIA DOS BICHOS
Escrito por Adriano Medeiros
em parceria com José Lacerda. Toda vida apreciei As coisas da natureza Porem sempre procurei Evitar a malvadeza Com os bichos sempre vivi Mas desde cedo escolhi Agir com delicadeza. Se tenho acesso à nobreza E a todo reino animal É porque já me foi dado O passaporte de pau Certa feita num pagode Pelo altivo Conde Bode Da corte do Bacurau. Leitor, não me leve a mal Se eu lhe disser que hoje em dia Considero superior À nossa diplomacia E outras obrigações tais Aquelas dos animais Que eu conheci certo dia. Já não preciso de guia Para adentrar nas florestas Seja de noite ou de dia Sou convidado pras festas Ajudo nas diretrizes E deixo os bichos felizes Quando conto suas gestas. As bactérias funestas Convivem meus intestinos Em harmonia com as raças Dos seres mais pequeninos Aos mais compridos e elásticos Foi num zoológico fantástico Que cruzamos os destinos. Corri com bichos meninos Nas montanhas das manhãs Ouvi em noites chuvosas As serenatas das rãs Brincava com as carochinhas Me agarrava com as oncinhas Como a brincar com as irmãs. Das belíssimas faisãs Eu sou amigo do peito Na corte do Rei Leão Sou tratado com respeito Nunca me fizeram nada E até mesmo a macacada Tem me achado bom sujeito. Estou em alto conceito No reino da bicharada E a confiança que vejo A mim hoje dispensada Isso eu tenho por capricho, Juro a meus amigos bichos Que nunca será frustrada. Soube que está marcada Com bastante antecedência De toda a bicharada Que tem sua residência Em ramos, caule, raiz Nas hostes desse país Uma grande conferência. Foi com certa impaciência Que aguardei chegar a data Então segui para Minas Para uma serra na mata Pra não correr nenhum risco Subi pelo São Francisco De carona com a Pata. Como não há gente ingrata No grande reino animal Demoramos na viagem Mais que o tempo normal Pois por onde se passava Sempre um bicho convidava Para um lanche coisa e tal. E conosco um Pica-pau Seguiu pra reunião Por isso já fui sabendo Que naquela ocasião Os bichos se reuniriam E ali discutiriam Os destinos da Nação. O feio Bicho Papão No caminho a gente viu Jegue ia pela margem Porque tem medo do rio E numa cena dantesca A Jibóia gigantesca Quase que nos engoliu. E quem primeiro nos viu Foi a Araponga cantora Coruja nos recebeu Com ares de professora E como quem está afim A Onça olhava pra mim Com olhos de caçadora. Uma elegante pastora Dessas da raça alemã Prestou-se a me proteger Tarde, noite e de manhã Numa pousada no mato Eu dividi o meu quarto Com a grande mestra Acauã. Do Sapo a esposa Rã Com a peruca aloirada Travava com o Veado Uma conversa animada Quando em traje verde oliva Em marcha firme a altiva Adentrou a macacada. Gorila estava zangada Tucano muito nervoso Uma Arara Azul de raiva Cachorro também raivoso E acompanhando um Faisão O elegante Pavão Sempre muito vaidoso. O Urubu majestoso Com a família real Criticava em alta voz O poder batraquial Favorito na eleição Dizendo que a Nação Com ele ia se dar mal. Apareceu Bacurau Preguiça veio da Bahia Serei veio do Rio De Brasília a Porcaria Do Pará Camaleão Tatu lá do Maranhão Trouxe um presente pra Jia. Trajada para a folia Chegou a pernambucana Era uma Carangueja Com a sombrinha bacana E preparada pra farra Em companhia da Cigarra A Formiga paulistana. Também veio a Caninana O Gato, o Tejuaçu A boiada de Goiás As grandes Éguas do Sul O Escaravelho, a Joaninha E a família todinha Do maestro Cururu. Um ricaço Boi Zebu Se chegou de Mato Grosso Siriema do sertão Era só couro e o osso Periquito discursando Maroca de vez em quando Esticava seu pescoço. Sapo estava bem mais moço Disposto e muito animado Seguido sempre de perto Por Gavião encarnado E Falcão, bom professor, Do Chile Mestre Condor Era dele convidado. Papagaio bem trajado Começou a reunião Mas as Araras Vermelhas Obstruem a votação E o rito silencioso Irritando o poderoso Ministro Dom Gavião. Eis que falam em cassação Mas radicais não recuam Logo chegam os Carcarás Que contra o Sapo atuam Os Gatos ficam assanhados E os Cachorros zangados Mostrando os dentes, acuam. Bichos moderados suam Mas não se chega a bom fim Foi preciso que o sapo Que estava bem junto a mim Desenvolva sua lavra Faça uso da palavra E Dom Sapo diz assim: «Vocês andam achando ruim Nosso modo de ação Porém nunca antes houve Na história dessa Nação Um governo como esse Desprovido de interesse De um líder pé no chão. Têm saudades do canhão, Da prisão, da ditadura? Querem voltar pra cadeia, Mergulhar na noite escura? Aceitem logo essa norma, Aprovem nossa reforma, Bichos da cabeça dura!» Rei Leão, cheio de fúria Interrompe a converseira «Parem essa discussão Araras mexeriqueiras Acabem esse carnaval Ou mando baixar o pau Nessa classe fofoqueira! Isso aqui não é uma feira É congresso de respeito Por isso obedeça ao sapo Que ele é um bom sujeito Pra tudo não dar em nada Advirto a bicharada: Vote a reforma direito!» E quando acabam o pleito A reforma é aprovada O Sapo abraça o Tucano Começa alegre noitada, Quando eu vejo estou dançando Alegremente sambando No meio da bicharada! Série Parceria - Vol. VII
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 12/02/2012
Alterado em 04/07/2014 Copyright © 2012. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |