José Medeiros de Lacerda

Leia poesia - A poesia é o remédio da alma

Textos

AS PERGUNTAS IDIOTAS E AS RESPOSTAS DE SEU LUNGA - PARTE 1
Conheço um senhor de idade
Que mora no Juazeiro
Na terra de Padim Ciço
Muito alegre e prazenteiro
Mas por não viver sorrindo
Por fim terminou caindo
Na boca do brasileiro

Nosso povo é presepeiro
E gosta de um sangramento
Basta um pequeno sopro
Já faz logo um pé de vento
Quem não tem o que falar
Se contenta em provocar
Um pequeno movimento

O assunto do momento
É esse senhor de idade
Seu Lunga do Juazeiro
Mangaeiro da cidade
Um pacato cidadão
Só um pouco resmungão
Contra qualquer leviandade

Homem de capacidade
Mas tem um curto pavio
Qualquer  pergunta idiota
Já lhe faz perder o fio
Da paz e da tolerância
Responde com ignorância
Aceitando o desafio

Poetas que nunca o viu
Se contenta em comentar
As perguntas que lhe fazem
E as respostas que ele dar
Se é disso que o povo gosta
Eu aceitei o proposta
E também vou comentar

Quando eu estive lá
Em sua mercearia
Com minha amiga Camila
Recebeu-nos com alegria
Mas fui logo constatando
Que o povo se aproveitando
De vez em quando um surgia

Acho que naquele dia
Ele foi mais visitado
Quando o povo descobriu
Que ele ia ser entrevistado
Por uma televisão
Foi nessa ocasião
Que deixou mais enfezado

Seu Lunga estava sentado
Camila lhe entrevistando
Microfone à sua frente
Chega alguém lhe perguntando:
- Está sendo entrevistado?
Ele respondeu zangado:
- Tou não, tou me confessando.

Depois ele foi contando
O que o povo lhe fazia
Por que ele tinha raiva
E nervoso respondia
E eu ali tudo gravando
Pra depois, selecionando,
Transformar tudo em poesia.

Nos contou que certo dia
Ele subiu no telhado
Pois uma telha quebrada
Deixava tudo alagado
Quando estava consertando
Ia um sujeito passando
E o deixou irritado.

«Aquele cabra safado
Fez a seguinte besteira
De ainda me perguntar:
- Está tirando goteira?
Respondi: - Não, tou botando!
E saí tudo quebrando,
Não deixei uma telha inteira!»

Com uma velha  "ligeira"
Batia num filho seu
Estava com tanta ira
Que o filho se contorceu,
Entre  um ai e outro ai
Dizia:-Tá bom, papai
Tá bom, pelo amor de Deus

Seu Lunga lhe respondeu:
-Sei que você está gostando,
Quando tiver ruim eu paro.
E continuou surrando
Só parou o desatino
Quando viu que o menino
Estava quase desmaiando.

Outra vez ele adentrando
Numa loja pra comprar
Veneno pra  matar ratos
Porém quando ao perguntar:
-Vocês aqui tem veneno?
O outro respondeu sereno:
-Tem .o senhor vai levar?

Ele não quis mais comprar
E deu logo de sair
Mas quando chegou a porta
Respondeu bem de perci:
-Num vou levar não, seus chatos,
Vou trazer todos os ratos
Pra comer veneno aqui.

Outra vez no Cariri
Seu Lunga estava jantando
Uma suculenta sopa
Estava saboreando
Num pequeno restaurante
Quando chega um estudante
No recinto foi entrando.

Vendo Seu Lunga jantando
Perguntou ao velho zanho:
- Tomando sopa, Seu Lunga?
O velho, de modo estranho,
Derramou no corpo a sopa
E respondeu numa popa:
- Tou não, tou tomando banho!

Seu Lunga é meio tacanho
Esquivo igual urubu
Um dia pesando arroz
Um cabra do Pajeú
Perguntou com outros dois:
- Como é que tá o arroz?
Lunga respondeu: - Tá cru!

Numa loja no Exu
Lunga foi comprar papel
Tinha ferido a cabeça
E coçava pra dedéu
Ele, pra se aliviar,
Coçava, mas sem tirar
Da dita cuja o chapéu.

A moça vendo o incréu
Coçar o seu ponto fraco
Disse-lhe:-Tire o chapéu
Para coçar com um cavaco
Ele disse:- E a mocinha,
Acaso tira a calcinha
Para coçar o tabaco?

Nesse ponto ele foi fraco,
Bruto, sem educação
Noutro episódio seu  Lunga
Tava chupando limão
Num vacilo descuidou
No seu olho respingou
E ele coçou com a mão.

De repente um cidadão
Que passava nessa hora
Perguntou: -Ardeu seu Lunga?
E ele sem ter demora
No dito olho espremeu
O limão e respondeu:
-Não, mas vai arder agora.

Seu Lunga em tempos de outrora
Trabalhou em Fortaleza
Foi chofer de coletivo
Trabalhava com firmeza
Até que um certo dia
Uma passageira atingia
O seu ponto de fraqueza

Lhe perguntou a freguesa
Como quem quer e não quer:
- Esse ônibus vai na praia?
Seu Lunga disse: -Mulher,
Se você tiver pra ele
Um biquíni que dê nele
Vai onde você quiser!

Mesmo cheio de mister
Seu Lunga foi militar
Tentou entrar na Marinha
Mas quando ao selecionar
A turma, um superior
A Seu Lunga perguntou:
- O jovem sabe nadar?

Se não sabe não vai dar
Pra servir na área náutica.
Seu Lunga, já enfezado,
Fez a pergunta automática:
- E se eu não souber voar
Com certeza não vai dar
Pra servir na Aeronáutica?

Ranzinza, cheio de prática,
Assim que Seu Lunga é
Certa vez em sua casa
Ele pediu à mulher
Que estava na cozinha
Depenando uma galinha:
- Oh, mulher, traz um café!

De lá de dentro a mulher
Também perguntou gritando:
- É para levar na Xícara?
E Seu Lunga, resmungando,
Disse: - Não, sua besta, não!
Derrame o café no chão
Venha com o rodo empurrando!

Lunga acordou bocejando
Forte sono ainda sentindo
Chegando no armazém
Simpático e até sorrindo
Mas voltou seu mau humor
Quando um freguês perguntou:
- Seu Lunga, tava dormindo?

Pelas paredes subindo
Com um mau humor de doer
E ainda mais com sono
Só limitou-se a dizer
Enquanto esbravejava:
- Gota serena, eu estava
Treinando para morrer!

Ainda pretendo escrever
Tudo que tenho guardado
Por enquanto só tem esta
Prosa em verso transformado.
Tem mais coisa controversa
Daquela nossa conversa
Com Seu Lunga entrevistado.

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 12/02/2012
Alterado em 06/12/2016
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