José Medeiros de Lacerda

Leia poesia - A poesia é o remédio da alma

Textos

A ESTRADA MAL ASSOMBRADA - UMA LENDA BRASILEIRA
Nem todo mundo acredita
Em alma ou assombração
Dizem que história de espírito
É só imaginação,
Mas vou contar um enredo
Que me arrepiou de medo
Dessa minha narração.

Um chofer de caminhão
Do tipo muito afamado
Desses que nada pra ele
Lhe deixava enrascado
Era um cabra destemido
Só andava prevenido
Temendo ser assaltado.

Andava sempre isolado
Nunca quis um ajudante
Só vivia viajando
Não parava um só instante
Sabia muito segredo
Mas de nada tinha medo
Quando estava no volante.

Certo dia o viajante
Passando uma travessia
O carro deu um defeito
No cabo da bateria
Fazendo o sinal da cruz
Ele disse, - Oh, meu Jesus,
Se ao menos fosse dia!

O carro se debatia
Sem ter força no motor
Era soltando pipoco
Sujo no carburador
Ele engatou a primeira
Porém no pé da ladeira
O carro velho estancou.

Quando o caminhão parou
A uma da madrugada
Nessa famosa ladeira
Que era mal assombrada
Era um local escondido
Onde já tinha morrido
Muita gente de virada.

Estórias de alma penada
De movimento bizarro
Caveiras se requebrando
Outras fumando cigarro
Eram causos que existia
Quem uma dessas coisas via
Metia a cara no barro.

O chofer desceu do carro
E levantou o capuz
Soprou no carburador
Buliu nos cabos de luz
Mas não achava o defeito
E um carro desse jeito
Carga nenhuma conduz.

Chamou logo por Jesus
Na hora que foi lembrando
Que daqueles cafundós
O povo vive falando
E fixou em sua mente:
- Não tenho medo de gente,
Quanto mais de alma penando!

Enquanto estava pensando
Um rapaz lhe apareceu
E foi logo perguntando:
- O que foi que aconteceu?
- Carro velho é que nem moça,
Faltou luz e faltou força.
O chofer lhe respondeu.

O rapaz lhe disse: - Eu
Quero também pelejar,
A dez anos sou mecânico
E pretendo lhe ajudar
Vou usar meus artifícios,
Se não for muito difícil
Eu desenrasco jajá.

Mexeu pra lá e pra cá
Do ofício fazendo jus
Abriu o radiador
Alguma coisa introduz
As mãos brancas como cera
Que era ver mão de caveira
Mostrando seus ossos nus.

Fechou e abriu o capuz
Deu um sopro no motor
Buliu nos fios da luz
Depois tirou o rotor
E deu uns dois solavancos,
Quando ele deu no arranco
O carro funcionou.

O chofer lhe perguntou:
- Para onde o senhor vai?
«Eu vou cortando camim
Que vou fazendo um atai,
Antes de raiá o dia
Quero estar na companhia
De mamãe e de papai.»

O chofer, - pois vai,
Pegue aí na direção
Já venho muito cansado
Estou sem disposição
Pelo que eu já dei fé
Parece que você é
Bom chofer de caminhão.

O outro pega a direção
E começa dirigindo
Motorista pouco a pouco
Um arrepio foi sentindo
O carro em toda embalada
E nas curvas da estrada
Parecia estar sumindo.

O carro ia zunindo
Chofer já desconfiava
O rapaz muito sisudo
Nem pro motorista olhava
Continuava em disparada,
Quanto mais ruim a estrada
Mais a carreira aumentava.

Motorista reclamava
Sem o rapaz perceber
O outro grita: - Rapaz
Não queira se aborrecer,
Este carro está cansado,
Você tem o pé pesado
E gosta muito de correr!

Por isso peço a voce
Com um pedido de amigo,
Maneire mais o seu pé
Que aqui não tem inimigo,
Se coce continuar
O carro vai se quebrar
E é maior nosso castigo.

O rapaz: disse: «Amigo,
Eu já fui chofer ativo
Dei uma grande virada
Hoje sou um fugitivo.
Por brincadeira eu virava
E carreira grande eu dava
No tempo que eu era vivo.»

Disse isso e deu um silvo
O chofer estremeceu
Deu um pequeno desmaio
Nem viu o que aconteceu,
E aquela alma reinante
Naquele mesmo instante
Dali desapareceu.

Quando o dia amanheceu
Se foi o claro da lua
Chofer descobriu que estava
Com a pele seminua
Na boléia desmaiado
E o carro estacionado
Bem no aceiro da rua.

Até hoje continua
Viajando nas estradas
Mas só viaja de dia
Não duvida mais de nada
Nunca mais ele fez hora
Quando alguém lhe conta estória
De espirito e alma penada.
SÉRIE LENDAS BRASILEIRAS - VOLUME 35
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 11/02/2012
Alterado em 20/11/2022
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