A LENDA DA MANDIOCA
Nordestino brasileiro
Que exerce agricultura Tem a mente caleijada Calcada a uma vida dura Na bonança ou no tormento Seu principal alimento É farinha e rapadura. Quando é tempo de fartura Roceiro tem caixa alta A vida vira uma festa A Natureza se exalta É colheita empaiolada, Mesa diversificada Mas a farinha não falta. A farinha está na pauta Do que eu pretendo contar Produto da mandioca A lenda que eu fui buscar No seio da natureza Estando ela com certeza Entre as mais belas que há. Aqui o leitor verá Meu maior objetivo Mostrar que o índio deixou-nos Legado bem expressivo Hoje marginalizado Seu habitar dizimado Mas nunca virou passivo. Num impulso decisivo Minha mente se refez No espírito da poesia Para falar desta vez No que a memória enfoca; E a LENDA DA MANDIOCA Eu deixo aqui pra voces. Numa tribo, certa vez, Houve cena inusitada: Uma jovem ficou grávida Sem ainda ser casada. Sendo filha do cacique Para que ao pai se explique De pronto é interpelada. «Meu pai, eu não sei de nada, - Insistiu a indiazinha - Com ninguém tive contato Pois ainda sou novinha!» Pra o pai tornou-se maldita Pois nela não acredita. Que sina, a da pobrezinha! A maldição se avizinha Naquela nação pagã O pajé, impressionado, Invocou o Deus Tupã Pra que houvesse solução E um pouco de compreensão Em respeito à cunhatã. Numa chuvosa manhã Tem o chefe uma visão Que lhe transmite um conselho E pede compreensão Não destruir a família E amparar sua filha Com aquela gestação. O chefe com emoção Resolveu acreditar Na inocência da filha E aquele tabu quebrar, Transcorrida a gestação Todos viram com emoção Uma criancinha chegar. Uma beleza sem par Trouxera um novo porvir Uma menina, branquinha, De cor incomum ali Praquele bebê nascido Um nome foi escolhido Batizaram de Mani. Mas o maior ti-ti-ti Pela tribo se espalhava Não só pela pele branca Que a menina apresentava: Não bastasse, já sabia Caminhar quando nascia Ademais, também falava. Sua pureza brilhava Envolvendo aquela gente Mas mesmo com tenra idade Aquela pobre inocente Sem doença, sem razão, Prostou-se naquele chão E dormiu eternamente. Seus guardiões simplesmente Ainda a julgavam dormindo E por isso não puderam Ver seu espírito saindo Foi enorme o desengano Quando notaram o engano Em que estavam caindo. O cacique pressentindo Não pôde fazer mais nada Reconheceu o desfecho De sua netinha amada Chorando resignou-se E ordenou que ela fosse Na própria oca enterrada. A tribo desconsolada Na aldeia grande abalo O cacique macambuzo Nada podia animá-lo No sepulcro a mãe amada Plantou flores perfumadas Todo dia ia regá-lo. Em um pequeno intervalo De tempo ali decorrido No dito lugar brotou Um mato desconhecido Aquela terra escavaram Contudo não encontraram O corpo do ser querido. «Nosso povo foi vencido! - Gritavam todos fiéis - Um povo comum seremos, - Sentenciaram os pajés - A terra já nos consome Nos resta a peste e a fome E da sorte um duro revés! Igual aos igarapés Onde existe água à vontade Haverá em nossos olhos Pranto e infelicidade Nada nos protegerá Jurupari nos trará Miséria e necessidade!» A Tupã, Deus de bondade, Todos pediam perdão Junto à cova da menina Faziam lamentação Se dizendo abandonados E esse ritual sagrado Dos pajés não foi em vão. No ribombar de um trovão Ouviram Tupã falar: - Não se aflijam, meus filhos, Não vou os abandonar Refaçam o túmulo escavado E por cem dias contados Com lágrimas devem regar. Toda tribo a se espantar Com a sentença que ouviram E no final de cem dias Assustados eles viram Tubérculos de cor marrom Miolo de branco tom Naquele solo surgiram. As raízes extrairam Botaram pra cozinhar Tinha um gosto vigoroso Um dom de revigorar Bradaram: «Isso é presente Pois mata a fome da gente Precisamos celebrar!» E começaram a criar Diversas variações A casca virou bebida Que causa alucinações Torrada virou farinha Recebendo na cozinha Mais diversificações. Caule cortado em frações Se usa para plantar Tem o nome de «Maniva» As partes de semear A cauda é «Manipuera» Sendo outra boa maneira Da indiazinha lembrar. «Mani» pra homenagear «Puera» é a parte ruim Coada no tipiti De onde sai o cauim É comida brasileira Com nome de Macaxeira, Mandioca ou Aipim. Na culinária é sem fim A maneira que é usada Tucupi é outra forma Que a raiz é depurada No Estado do Pará Pra fazer o tacacá Comida africanizada. A folha jovem é usada Pra fazer um refogado Com outras ervas nativas e se chama «esparregado» A cachaça é a «tiquira» Que outros chamam «imbira» Variando por Estado. Enfim, é grande o legado Que a indiazinha deixou Como a mãe de Jesus Cristo, Um espírito gerou Essa linda cunhatã Concebida por Tupã E sua mãe não pecou. Esta lenda se criou No Estado do Pará Onde hoje é Santarém, A Mani nasceu por lá Mas é lenda brasileira Engrandecendo a bandeira Da cultura popular. Lembrando, só por falar, A famosa tapioca Com a menininha lembrada Essa memória se enfoca Raiz que em oca nasceu Dessa forma recebeu A alcunha de «Manioca». SÉRIE LENDAS BRASILEIRAS - VOLUME 9
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 31/01/2011
Alterado em 19/11/2022 Copyright © 2011. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |