José Medeiros de Lacerda

Leia poesia - A poesia é o remédio da alma

Textos

LAMPIÃO, O REI DO CANGAÇO - PARTE 1
Existem muitas histórias
Sobre este bandoleiro
Eu também tenho direito,
Baseado no roteiro
De fazer minha versão
Da vida de Lampião
O maior dos cangaceiros

Trabalhadores ordeiros
Família conceituada
Quatro irmãos, com ele cinco
Irmãs tinha uma cambada
Sua vida se revela
Num sítio de Vila Bela
Que hoje é Serra Talhada

O melhor na Vaquejada
Famoso em todo sertão
Foi vaqueiro e almocreve
Caçador e artesão
O filho de Zé Ferreira
Dos vaqueiros da ribeira
Vinha sendo o campeão.

Como diz a certidão
Numa tarde alviçareira
De um dia sete de outubro
Sem dar trabalho a parteira
A sua mãe consciente
Deu a luz a esse vivente
Filho do casal Ferreira.

Cresceu naquela ribeira
Com muita vivacidade
Revelando inteligência
Logo aos seis anos de idade
Traído pelo destino
Não tivera Virgulino
A luz da civilidade.

Com nove anos de idade
Foi prá escola estudar
Não era bem comportado
Mas era um aluno exemplar,
Com três meses e alguns dias
Virgulino já sabia
Ler, escrever e contar.

Só gostava de brincar
De cangaço e tiroteio
Imaginando guerrilhas
Com a meninada no meio
Se o pai saía a cavalo
Teria de acompanhá-lo
Sem de nada ter receio.

Cresceu assim nesse meio
Com vaqueiro e tangerino
Certa vez ao encontrar-se
Com um cigano peregrino
Esse ao ler a sua sorte
Só previu rastros de morte
Nas trilhas do seu destino

Sanfoneiro e dançarino
Bom poeta e repentista
Nos bailes a moçarada
Disputava sua conquista
Se uma o conquistava
As outras acompanhava
Prá não perdê-lo de vista

Tinha um defeito na vista
Na visão do olho direito
Lhe facilitando a mira
Impondo aos outros respeito
Coragem não lhe faltava
E quando alguém fracassava
Sorria bem satisfeito.

Topava onça no peito
Por dentro do matagal
Com dezessete de idade
Como era natural
Sem mudar o pensamento
Comprou seu equipamento
Pistola, alforje e bornal..

Com dezenove, afinal
Sentiu a seta do amor
Ferindo o seu coração
Por uma morena flor
No ano de dezesseis
Viu Rosa a primeira vez
E logo se apaixonou.

Era Rosa, seu amor,
A mais linda da ribeira
Em maio no encerramento
Da festa da padroeira
Em Nazaré festejada
O encontro da namorada
Com Virgulino Ferreira.

Essa fase alviçareira
Teve pouca duração
Raras vezes se encontrava
Com a flor de tanta paixão
Destino cruel serpente
Por caminho diferente
Magoou seu coração.

Deixando à parte a paixão
A família dos Ferreira
Teve um desentendimento
Com um coronel da ribeira
A briga de virgulino
Com seu José saturnino
Passou-se desta maneira:

O vizinho dos Ferreira,
Saturníno o fazendeiro
Patente de coronel
Dono de terra e dinheiro
Por causa de um morador
Nascera o grande rancor
Do futuro cangaceiro.

O morador presepeiro
Furtara sem precisão
Uns bodes de Zé Ferreira
Sendo agarrado o ladrão
Manoel Lopes sozinho
De Vírgulíno o padrinho
O levou para a prisão.

Zé Saturníno, o patrão
Ficou muito aborrecido
Ao ver o seu morador
Trancafiado, oprimido.
Por um simples inspetor
De quarteirão sem valor
Humilhado e perseguido

Rancoroso e decidido
Vingou-se nos animais
Da fazenda dos Ferreira
Com seus instintos brutais
Ante essa situação
De baixa perseguição
Surgiram golpes brutais

Entre as famílias rivais
Cada qual mais soberana
Campeava a ignorância
Infernal e desumana
Naqueles termos tão feios
Emboscadas, tiroteios
Havia toda semana.

Prevendo a sorte tirana
Com os filhos dessa maneira
Para evitar novas lutas
Mudou-se prá outra ribeira
Poço do Negro escolhido
Foi o canto preferido
Do senhor José Ferreira

Passou-se uma semana inteira
Sem agressões e sem nada
Até que Zé Saturníno
Chegou perto da morada
Dos seus rivais inimigos
Sem respeitar os perigos
E caiu numa emboscada.

Ferido Antônio a facada
Cresceu do ódio o efeito
Adolfo de Vila Bela
Doutor Juiz de Direito
Junto a Cornélio Soares
Cada qual em seus lugares
Fazem um acordo perfeito.

Mas aí não teve jeito
Porque os Ferreira um dia
Foram fazer uma visita
A Joaninha, sua tia
Saturníno sabedor
Manda um negro morador
Emboscar na travessia

O negro que emboscaria
Malvado como serpente
Comia carne de cobra
Bebia sangue de gente.
As feras não se encontraram
Os meninos regressaram
Por caminho diferente

Com um ano mais prá frente
Regressava Saturníno
Da feira de Nazaré
Desconfiado e ladino
No meio da caminhada
Caira numa emboscada
Dos irmãos de Vírgulíno.

Porém José Saturníno
Não temia prejuízo
Já deixou o velho Ferreira
A noite de sobreaviso
Respondendo ao tiroteio
No dia seguinte veio
Foi um dia de juízo..

Saturníno foi preciso
E atacou a moradia
De Vírgulíno e a avó
Naquele dantesco dia
José Guedes foi ferido
Companheiro destemido
Que aos Ferreira defendia

As baixas acontecia
Com freqüência e profusão
Balas cortavam o ar
Corpos rolavam no chão
Por dentro da mata bruta
Só abandonaram a luta
Por falta de munição.

Segunda acomodação
Nova palavra empenhada
Com pouco tempo depois
Toda jura foi quebrada
Ninguém cumpriu o dever
O termo do bom viver
Não estava influindo nada.

Difícil prá Ferreirada
Desse jeito continuar
Morando perto de alguém
Sem nunca a paz encontrar
Já cansada de vigília
Mudou-se a dita família
Para um distante lugar.

As chances de trabalhar
Não estavam nada boas
José Ferreira e Maria
Os filhos e outras pessoas
Encontraram vida franca
Em Matinha de Água Branca
No Estado de Alagoas.

Mas tiveram vidas boas
Por alguns meses somente
José Ferreira vivia
Perturbado seriamente
Pela mudança forçada.
A família injustiçada
Pensava bem diferente.

Os Ferreira renitentes
Falavam sempre em vingança
A venda dos seus pertences
O prejuízo, a mudança
Pelos demais perseguidos
Quase trinta anos perdidos
Vendo já morta a esperança.

E ficaram na estância
Sem da roça se afastar
Deixando Zé Saturníno
Uns dias acreditar
Na impossibilidade
De algum tempo na verdade
A família se vingar

Em casa a se acumular
Rifles, bornais, munição
O ódio, o rancor, a mágoa
Consultaram o coração
Matilde junto a Marinho
Com os Ferreira bem cedinho
Atacaram o valentão.

Marinho era homenzarrão
E Matilde homem valente
De Vírgulíno Ferreira
Eram amigos e parentes
Peritos na carabina
Doidos por carnificina
Ferozes como serpentes

Acordaram finalmente
Sob intenso tiroteio
O coronel Saturníno
Cinco horas de aperreio
Queimaram fazenda e gado
Vendo o velho baleado
Fugiram daquele meio.

Porém Saturníno veio
Vingar-se da grosseria
José Ferreira imitava
Um judeu sem moradia
Surge outro abalo febril:
Em vinte, a quatro de abril,
Faleceu Dona Maria.

O velho então voltaria
Pra o solo pernambucano
Foi morar em Pariconhas
Coberto de desengano
Pra aumentar a confusão
Prenderam seu filho João
Num gesto bem desumano.

Chegando a notícia aos manos
De tão grande covardia
A casa do delegado
Invadiram no outro dia
Da sala até o poleiro
Não deixaram nada inteiro
Lá em sua moradia.

Depois da pancadaria
Da casa do delegado
Zé Lucena com a volante
Atacou de lado a lado
Dos Ferreira a residência
E o velho sem resistência
Perde a vida fuzilado.

Os meninos no roçado
Escutaram a quebradeira
Correram, encontraram o corpo
Do velho José Ferreira
Juraram naquele dia
Que o seu luto seria
Rifle, bala e cartucheira.

Surge a vida cangaceira
Dos filhos de Vila Bela
João Ferreira ficou
Com o encargo da tutela
Num compromisso fiel
Cuidando de Ezequiel,
Das manas com a parentela.

João saiu de Vila Bela
Vivendo igual forasteiro
No ano de vinte e sete
Fôra preso em Juazeiro
Pelo sargento Firmino
Famoso como assassino
Que o levou até Salgueiro.

As irmãs do cangaceiro
Nenhuma ficou solteira
Uma casou com Virgínio
Sendo fiel companheira
E ainda mais quatro havia
Amália, Angélica, Maria
E Virtuosa Ferreira.

Nas batalhas cangaceiras
O Valente Virgulino
Tinha ao seu lado três manos
Cada qual o mais ladino
Brigavam até com o demônio
Ezequiel e Antônio
Ferreira junto a Levíno.

Dos irmãos de Virgulino
Era o Levíno Ferreira
Afoito e muito valente
Dentre toda cabroeira
O primeiro assassinado
Num tiroteio cerrado
Pelo tenente Oliveira.

Na zona caririzeira
Do estado paraibano
No ano de vinte e cinco
O bravo pernambucano
Perde a vida de repente
Lampião profundamente
Sente esse golpe tirano.

Antônio Ferreira, o mano
Mais velho da irmandade
Sisudo, de olhar sombrio,
Sua maior qualidade
Era atacar de surpresa
Deixando a volante presa
A sua própria vontade.

Uma simples fatalidade
Fulminou o bandoleiro
Lá na Fazenda Pipocas
De Ermíno do Umbuzeiro
Uma arma escorregou
E ao cair detonou.
Acertando o cangaceiro.

Ezequiel, o derradeiro
Dos irmãos de Virgulino
Entrou para o banditismo
Ainda quase menino
Era um grande atirador
Recebendo sem favor
O apelido Ponto Fino.

Em trinta e um veio a pino
Na Fazenda Capoeira
No Estado da Bahia
Num dia de quinta-feira
Tinha cercado o tenente
Arsênio, homem valente
Que odiava os Ferreira

Por uma bala certeira
Atrás de uma cerca forte
Foi Ponto Fino alvejado
Ferido não teve sorte
Lampião não se consola
Sacou de uma pistola
Antecipando-lhe a morte.

Mesmo sendo um homem forte
Sentiu um abalo profundo
Um irmão preso e três mortos
Se viu sozinho no mundo
Mas sua fiel cabroeira
Ergueu a sua bandeira
Sem desprezá-lo um segundo.


Criou fama e todo mundo
Quis conhecer Lampião
Mas esse mesmo bandido
Queria ser capitão
Resolvendo o cangaceiro
Visitar o Juazeiro
Do Padre Cícero Romão.

Mas em outra ocasião
Eu conto tudo depois
Conheça logo essa história
Que minha rima propôs,
Seguindo o mesmo roteiro
A morte do cangaceiro
Virá no volume dois.
Série Cangaceiros, Vol. II
Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 16/12/2009
Alterado em 15/02/2017
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários

Site do Escritor criado por Recanto das Letras